Estudo sobre João 10
Estudo sobre João 10
O pastor e suas ovelhas - 10:1-6
O pastor das ovelhas - 10:1-6 (cont.)
A porta rumo à vida - 10:7-10
O pastor verdadeiro e o pastor falso - 10:11-15
A unidade final - 10:16
A escolha do amor - 10:17-18
Louco ou Filho de Deus - 10:19-21
A afirmação e a promessa - 10:22-28
A afirmação e a promessa - 10:22-28 (cont.)
A grande confiança e a tremenda afirmação - 10:29-30
Um convite à prova amarga - 10:31-39
A paz que precede a tormenta - 10:40-42
O pastor e suas ovelhas - 10:1-6
O pastor das ovelhas - 10:1-6 (cont.)
A porta rumo à vida - 10:7-10
O pastor verdadeiro e o pastor falso - 10:11-15
A unidade final - 10:16
A escolha do amor - 10:17-18
Louco ou Filho de Deus - 10:19-21
A afirmação e a promessa - 10:22-28
A afirmação e a promessa - 10:22-28 (cont.)
A grande confiança e a tremenda afirmação - 10:29-30
Um convite à prova amarga - 10:31-39
A paz que precede a tormenta - 10:40-42
O PASTOR E SUAS OVELHAS
Estudo sobre João 10:1-6
A imagem de Jesus que mais agrada é a que o apresenta como o Bom Pastor.
A imagem do pastor está profundamente enraizada na linguagem e nas imagens
bíblicas. Não podia ser de outro modo. A maior parte da Judéia é uma planície
central. estende-se desde Betel ao Hebrom, cobrindo 56 Km. Sua largura é de 22
a 27 Km. A maior parte do terreno é rochoso e desnivelado. Portanto, e como é
natural, Judéia é uma região muito mais dedicada ao pastoreio que à
agricultura. De modo que era inevitável que a imagem mais cotidiana da zona
montanhosa da Judéia fosse o pastor. A vida do pastor palestino era muito dura.
Na Palestina, nenhum pastor pastoreia sem um rebanho, e o pastor nunca
está fora de seu posto. Há pouco pasto e as ovelhas vão muito longe. Não há
cercos protetores e é necessário cuidar dos animais o tempo todo. De ambos os
lados da estreita planície, o terreno se confunde com o deserto rochoso e
sempre é possível que as ovelhas se afastem e se percam. O trabalho dos
pastores era constante e perigoso visto que, além disso, deviam proteger a seus
rebanhos dos animais selvagens, em particular contra os lobos, e sempre havia
ladrões e assaltantes dispostos a roubar as ovelhas.
Sir George Adam Smith, que viajou pela Palestina, escreve: “No topo de
algum monte através do qual se ouve o grito das hienas durante as noites,
quando o encontra sem dormir, com o olhar fixo na distância, açoitado pelo
clima, apoiado sobre sua fortificação e cuidando das ovelhas dispersas, cada
uma das quais ocupa um lugar em seu coração, entende-se por que o pastor da
Judéia chegou a ocupar o primeiro lugar na história de seu povo; por que deram
seu nome ao rei e o converteram no símbolo da providência; por que Cristo o
tomou como exemplo de renunciamento.”
A vigilância constante, a coragem ilimitada, o amor paciente para com
seu rebanho, eram as qualidades necessárias do pastor. No Antigo Testamento,
costuma-se falar de Deus como o pastor, e do povo como seu rebanho. "O
SENHOR é meu pastor; nada me faltará" (Salmo 23:1). “Guiaste o teu povo,
como a um rebanho, pela mão de Moisés e de Arão” (Salmo 77:20). “Assim, nós,
teu povo e ovelhas de teu pasto, te louvaremos eternamente” (Salmo 79:13). “Dá
ouvidos, ó pastor de Israel, tu que conduzes a José como um rebanho” (Salmo
80:1). “Ele é o nosso Deus, e nós, povo do seu pasto e ovelhas de sua mão” (Salmo
95:7). “Somos o seu povo e rebanho do seu pastoreio” (Salmo 100:3). O Ungido de
Deus, o Messias, também é apresentado como o pastor das ovelhas. “Como pastor,
apascentará o seu rebanho; entre os seus braços recolherá os cordeirinhos e os
levará no seio; as que amamentam ele guiará mansamente” (Isaías 40:11).
"Apascentará o rebanho do Senhor com fidelidade e justiça e não permitirá
que nenhuma tropece. Conduzirá todas com segurança" (Salmo de Salomão
17:45). Os líderes do povo são descritos como pastores do povo e da nação de
Deus. “Ai dos pastores que destroem e dispersam as ovelhas do meu pasto!” (Jeremias
23:1-4). Ezequiel expressa uma terrível condenação para os líderes falsos que
perseguem seu próprio bem antes que o de seu rebanho. “Ai dos pastores de
Israel que se apascentam a si mesmos! Não apascentarão os pastores as ovelhas?”
(Ezequiel 34:2).
Esta imagem passa ao Novo Testamento. Jesus é o Bom Pastor. É o pastor
que arriscará sua vida para buscar e salvar a ovelha extraviada (Mateus 18:12;
Lucas 15:4). Compadece-se do povo porque são como ovelhas sem pastor (Mateus 9:
36; Marcos 6:34). Os discípulos são seu pequeno rebanho (Lucas 12:32). Quando
se fere o pastor, dispersam-se as ovelhas (Marcos 14:27; Mateus 26:31). Ele é o
Pastor das almas dos homens (1 Pedro 2:25) e o grande Pastor das ovelhas
(Hebreus 13:20).
Tal como na imagem do Antigo Testamento, os líderes da Igreja são os
pastores e o povo é o rebanho. O dever do líder é alimentar ao rebanho de Deus,
aceitar seu cuidado voluntariamente, não por força, fazê-lo com o ânimo bem
disposto, não por amor ao dinheiro, nem fazer uso de sua posição para exercer
poder sobre o povo; deve tornar-se exemplo para sua grei (1 Pedro 5:2-3). Paulo incita aos anciãos de Éfeso
a cuidar de todo o rebanho sobre o qual os pôs o Espírito Santo (Atos 20:28). A
última ordem de Jesus a Pedro é que alimente a seus cordeiros e suas ovelhas
(João 21:15-19).
Os judeus tinham uma bonita lenda para explicar por que Deus tinha
escolhido a Moisés para conduzir a seu povo. "Quando Moisés apascentava as
ovelhas de seu sogro no deserto, escapou um cordeiro. Moisés o seguiu até que
chegou a uma garganta onde encontrou um poço para beber água. Quando o alcançou
disse: 'Não sabia que escapou porque tinha sede. Agora deve estar muito
cansado.' Carregou o cordeiro sobre os ombros e o levou até o rebanho. Então
Deus disse: 'Porque mostrou compaixão ao carregar a uma criatura de um rebanho
que pertencia a um homem, conduzirá a meu rebanho, Israel.' "Quando
pensamos na palavra pastor deveria evocar em nós a vigilância e a paciência
incessantes do amor de Deus. E deveria nos recordar nosso dever para com nosso
próximo, em especial se ocuparmos algum posto na Igreja de Cristo.
O PASTOR DAS OVELHAS
Estudo sobre João 10:1-6 (continuação)
O pastor palestino tinha certos hábitos que o diferenciavam do de outras
regiões. A fim de compreender bem esta imagem devemos ver esse pastor e a forma
em que trabalhava.
O equipamento do pastor era muito simples. Tinha sua bolsa. Esta era
feita da pele de animal e a usava para levar comida. Não continha nada mais que
pão, fruta seca, algumas azeitonas e queijo. Tinha uma funda. A habilidade de
muitos homens da Palestina era tal que “atiravam com a funda uma pedra num
cabelo e não erravam.” (Juízes 20:16). O pastor usava a funda para defender-se
e atacar, mas também, dava-lhe um uso estranho. Na Palestina não havia cães
pastores e quando o pastor queria chamar uma ovelha que se afastou muito punha
uma pedra na funda e a fazia cair justo frente ao focinho do animal que se
estava afastando como advertência para que retornasse. Tinha um cajado. Era um
pau de madeira, bastante curto. Em um extremo tinha uma cunha na qual se
costumavam pregar os pregos. No extremo superior havia um corte através do qual
passava um cordão. Este cordão se usava para pendurar o cajado do cinturão. O
cajado era uma arma que empregava para defender-se a si mesmo e a seu rebanho
contra os animais e os ladrões. Tinha sua vara. Esta era como o gancho do
pastor. Podia usar para agarrar e fazer retornar qualquer ovelha que se
afastava mais do conveniente. Ao cair o dia, quando as ovelhas voltavam ao
redil, o pastor atravessava a vara na porta, perto do chão, e as ovelhas tinham
que passar por baixo (Ezequiel 20:37; Levítico 27:32). À medida que passavam, o
pastor olhava se tinham recebido algum golpe ou se tinham sido feridas durante
o dia.
A relação entre o pastor e as ovelhas da Palestina é muito peculiar. Em
muitos países se criam ovelhas para sacrificá-las; na Palestina, ao contrário,
se criam ovelhas em grande medida para obter lã. É por isso que as ovelhas
podem estar durante anos com o pastor. Este está acostumado a lhes dar
diferentes nomes com os quais descreve alguma de suas características:
"pata marrom", "orelha negra".
Na Palestina, os pastores caminhavam diante das ovelhas e estas o seguiam.
O pastor ia na frente para assegurar-se de que o caminho era seguro e que não
havia nenhum perigo. Às vezes tinha que alentar as ovelhas para que o seguissem.
Uma viajante relata que em uma oportunidade viu um pastor que guiava a suas
ovelhas chegar a um vau. As ovelhas resistiam a cruzar.
Por fim o pastor solucionou o problema carregando um dos cordeiros. Quando
a mãe viu sua cria do outro lado também cruzou; o resto do rebanho não demorou
para seguir seu exemplo. É estritamente certo que as ovelhas conhecem e
entendem a voz do pastor oriental e que jamais responderão à voz de um
estranho. H. V. Morton nos dá uma bela descrição da forma em que o pastor fala
com as ovelhas.
“Às vezes lhes fala com voz elevada, seguindo algum tipo de ritmo e com
uma linguagem estranha que não se parece com nenhuma outra. A primeira vez que
escutei este idioma de ovelhas e cabras estava nas serras que jazem detrás de Jericó.
Um pastor de cabras tinha descido a um vale e estava escalando a ladeira da
serra de frente quando, ao dar a volta, viu que as cabras ficaram atrás para
comer um pasto muito tenro. Elevou a voz e falou com suas cabras na mesma
linguagem que Pão deve ter empregado para dirigir-se às montanhas da Grécia.
Era estranho porque não tinha nenhum característico humano. As palavras eram
sons animais dispostos em algum tipo de ordem. Logo que falou se ouviu um
balido no rebanho e um ou dois animais voltaram suas cabeças em direção ao
pastor. Entretanto, não o obedeceram.
“Então o pastor gritou uma palavra e emitiu um som misturado com um tipo
de risada. Imediatamente uma cabra que tinha um guizo ao redor do pescoço
deixou de comer, abandonou o rebanho e trotou rumo ao vale, cruzou-o e subiu a
outra serra. O homem, acompanhado por este animal, continuou caminhando e
desapareceu depois de uma rocha. Em seguida estendeu o pânico no rebanho.
Esqueceram-se do pasto. Buscaram o pastor com o olhar. Tinha desaparecido.
Deram-se conta de que a cabra que levava o guizo já não estava ali. De longe
chegou o estranho chamado do pastor e ao ouvi-lo o rebanho inteiro saiu em uma
correria, cruzou o vale e subiu a serra” (H. V. Morton, In the Steps of the
Master, págs. 154-155). W. M. Thomson, em seu livro The Land
and the Book descreve a mesma imagem.
“O pastor dá um guincho de vez em quando, para lhes recordar que está
ali. Reconhecem sua voz e a seguem. Mas se aquele que grita é um estranho,
ficam imobilizadas, levantam as cabeças assustadas e, se for repetir, saem
correndo porque não reconhecem a voz de um estranho. Fiz a prova várias vezes.”
Trata-se a mesma imagem que João descreve.
H. V. Morton descreve uma cena que viu em uma cova perto de Belém. Dois
pastores tinham reunido a suas ovelhas para passar a noite. Como as separariam?
Um dos pastores se afastou um pouco e emitiu seu chamado peculiar que só suas
próprias ovelhas conheciam. Em pouco tempo, todo o rebanho tinha deslocado para
ele porque conheciam sua voz. Não se tivessem aproximado se se tratasse de
qualquer outro, mas conheciam o chamado de seu próprio pastor.
Um viajante do século XVIII relata de que maneira as ovelhas da Palestina
dançavam, com distinto ritmo, quando escutavam um assobio ou uma melodia que seu
próprio pastor interpretava na flauta. Todos os detalhes da vida do pastor
arrojam luz sobre a imagem do Bom Pastor cuja voz suas ovelhas ouvem e cuja
preocupação constante se dirige ao rebanho.
A PORTA RUMO À VIDA
Estudo sobre João 10:7-10
Os judeus não compreenderam o sentido do relato do Bom Pastor. Por isso
Jesus abertamente, de maneira franca e sem rodeios, aplicou-o a si mesmo.
Começou dizendo: "Eu sou a porta." Nesta parábola Jesus se
referiu a duas classes de redis. Nas aldeias e nos povoados havia currais comunais
nos quais se refugiavam todos os rebanhos da aldeia quando retornavam de noite.
Estes currais estavam protegidas por uma porta muito forte cuja chave estava na
mão do guardião da porta e de ninguém mais. A essa classe de curral é ao que se
refere Jesus nos versos 2 e 3. Mas quando as ovelhas estavam nas serras na
estação cálida e não voltavam de noite para a aldeia, eram reunidas em currais
construídos nas serras. Estes eram espaços abertos cercados por uma parede.
Tinham uma abertura pela qual entravam e saíam as ovelhas mas careciam de qualquer
espécie de porta. O próprio pastor se deitava através da abertura e nenhuma
ovelha podia sair ou entrar sem passar por cima dele. No sentido mais literal,
o pastor era a porta; não se podia ter acesso ao curral exceto através dele.
Era nisso que Jesus pensava ao dizer: "Eu sou a porta."
Através dele, e só através dele, os homens se encontram com Deus. "Por
meio dele", disse Paulo, "os uns e os outros temos entrada por um
mesmo Espírito ao Pai" (Efésios 2:18). O autor disse aos hebreus,
"Ele é o novo e vivo caminho" (Hebreus 10:20). Jesus abre o caminho
rumo a Deus. Até Jesus chegar, os homens só podiam pensar em Deus de duas maneiras:
no melhor dos casos, como um estranho e, no pior dos casos, como um inimigo.
Mas Jesus precisou dizer e mostrar aos homens como era Deus e lhes abrir o
caminho rumo a Ele. É como se Jesus nos apresentasse a Deus, coisa que jamais
teríamos podido descobrir ou obter por nossa conta. Jesus abriu aos homens a
porta que conduz para Deus. É a única porta através da qual os homens podem
aproximar-se a Deus.
A fim de descrever, em parte, o que significa esse acesso a Deus, Jesus
emprega uma frase muito conhecida pelos hebreus. Diz que através dele podemos
entrar e sair. A possibilidade de ir de um lado para outro sem problemas era a
forma que tinham os judeus de descrever uma vida absolutamente segura e
protegida. Quando um homem pode sair e entrar sem temor significa que seu país
está em um estado de paz, que as forças da lei e a ordem exercem uma autoridade
suprema e que desfruta de uma segurança perfeita em sua vida. O líder de uma
nação deve ser alguém que possa sair diante deles e entrar diante deles
(Números 27:17). Ao referir-se ao homem que obedece a Deus se diz que é bendito
quando entra e bendito quando sai (Deuteronômio 28:6). Um menino é alguém que
ainda não é capaz de sair e entrar por seus próprios meios (1 Reis 3:7). O
salmista está seguro de que Deus guardará sua saída e sua entrada (Salmo
121:8). Uma vez que o homem descobre, através de Jesus Cristo, como é Deus,
experimenta um sentimento novo de segurança e amparo em sua vida. Se a vida
estiver nas mãos de um Deus como esse, desaparecem os temores e as
preocupações.
Há uma grande diferença entre Jesus e os homens que o precederam. Jesus
disse que esses eram ladrões e salteadores. É obvio que ao dizer isso não se
referia à grande sucessão de profetas e de heróis. Fazia referência aos
aventureiros que apareciam com freqüência na Palestina e prometiam uma idade de
ouro àqueles que os seguissem. Todos eles eram revolucionários e insurretos.
Criam que para chegar à idade de ouro os homens deveriam atravessar rios de
sangue. Nesta mesma época, Josefo relata que houve dez mil desordens na Judéia;
tumultos provocados por guerreiros. Fala de homens como os zelotes que não se
importavam perder a própria vida e matar a seus seres queridos se com isso
podiam cumprir seus planos de triunfo e conquista. O que diz Jesus é o seguinte: "Houve homens que afirmavam que eram líderes
que Deus lhes enviava. Criam na guerra, no assassinato, na morte. Seu caminho
só conduz cada vez mais longe de Deus. Meu caminho é o da paz, do amor e da
vida. E meu caminho, se vocês se animarem a escolhê-lo, conduz cada vez mais
perto de Deus."
Houve e ainda há gente que pensa que terá que alcançar a idade de ouro
por meio da violência, da luta de classes, do ódio, da destruição. A mensagem
de Jesus é que o único caminho que conduz a Deus no céu e à idade de ouro na
Terra é o caminho do amor.
Jesus afirma que veio para que os homens tivessem vida e para que a
tivessem com abundância. A frase que se emprega para expressar que a tenham em
abundância é uma expressão grega que significa ter um excedente, uma
superabundância de algo. Seguir a Jesus, saber quem é e o que significa é ter
uma superabundância de vida. Conta-se a história de um soldado romano que se
apresentou a Júlio César para lhe pedir permissão para suicidar-se e pôr fim a
sua vida.. Era uma criatura desgraçada, triste, desanimada, sem a menor
vitalidade. César o olhou. "Homem", disse, "alguma vez esteve
vivo?" Quando tratamos de viver nossa própria vida, é-nos um pouco aborrecida,
escura. Quando caminhamos junto a Jesus, quando reconhecemos sua presença em
nossas vidas, estas se enchem de uma nova vitalidade, de uma superabundância de
vida. Só quando vivemos com Cristo, a vida se converte em algo vale a pena
viver e começar a vivê-la em todo o sentido do termo.
O PASTOR VERDADEIRO E O PASTOR FALSO
Estudo sobre João 10:11-15
Esta passagem estabelece o contraste entre o bom pastor e o mau pastor,
o pastor leal e o pastor desleal. Na Palestina, o pastor era o único responsável
pelas ovelhas. Se a estas acontecia algo, tinha que apresentar algum tipo de
prova para demonstrar que não tinha sido culpa dela. Amós diz que o pastor
resgata da boca de um leão duas pernas ou a ponta de uma orelha (Amos 3:12). A
Lei estabelecia: “Se for dilacerado, trá-lo-á em testemunho disso” (Êxodo
22:13).
A idéia é que o pastor devia levar uma prova de que a ovelha tinha morrido
e que ele tinha sido incapaz de evitá-lo. Davi relata a Saul que quando cuidava
as ovelhas de seu pai lutava contra o leão e o urso (1 Samuel 17:34-36). Isaías
fala do grupo de pastores que foram chamados para lutar contra o leão (Isaías
31:4). Para o pastor, o mais natural do mundo era arriscar sua vida por seu
rebanho. Às vezes o pastor tinha que fazer algo mais que arriscar sua vida
pelas ovelhas, devia entregar sua vida por elas. Isto acontecia em particular
quando os ladrões e os salteadores se aproximavam para atacar o rebanho.
Em seu livro The Land and the Book, o Dr. W. M. Thomson escreve: “Ouvi
com profundo interesse suas descrições gráficas das lutas cruéis e desesperadas
com estas bestas selvagens. E quando o ladrão e o salteador se aproximam (coisa
que fazem, por certo! o pastor está acostumado a ter que arriscar sua vida para
defender o rebanho. Conheci mais de um caso no qual entregou a vida na luta. Um
pobre moço lutou a primavera passada entre Tiberíades e Tabor, contra três
salteadores beduínos até que o destroçaram com suas armas e morreu entre as
ovelhas que defendia”.
O pastor autêntico jamais titubeia em arriscar, e até oferecer, a vida por
suas ovelhas.
Mas, por outro lado, também havia o pastor falso e desleal. A diferença
é a seguinte. O verdadeiro pastor nascia para desempenhar sua tarefa. Era
enviado a cuidar o rebanho logo que tinha a idade suficiente para fazê-lo. A
vocação de pastor ia desenvolvendo-se nele: as ovelhas se convertiam em suas
amigas e companheiras e assumiam como algo natural o fato de pensar nas ovelhas antes que em si mesmo. O falso pastor,
ao contrário, ocupava-se do rebanho não como vocação mas sim como um meio de
ganhar dinheiro. A única e exclusiva razão pela qual se ocupavam das ovelhas
era para cobrar dinheiro. Até podia ser alguém que foi às montanhas porque a
cidade lhe resultava muito hostil. Não tinha noção da importância e da
responsabilidade inerentes a seu chamado. Era um mercenário. Os lobos
constituíam uma ameaça para o rebanho. Jesus disse que enviava a seus discípulos
como ovelhas em meio de lobos (Mateus 10:16). Paulo advertiu aos anciãos de
Éfeso que chegariam lobos rapaces que não perdoariam às ovelhas (Atos 20:29). Estes
lobos atacavam e o pastor mercenário abandonava tudo para salvar sua própria
vida. Zacarias assinala como característica de um pastor falso o fato de que
não faz nenhum esforço para reunir as ovelhas dispersas (Zacarias 11:6).
Em uma oportunidade, o pai de Carlyle usou esta imagem de maneira
amarga. No Ecclefechan tinham problemas com o ministro e se tratava da pior
espécie de problemas, um problema de dinheiro. O pai de Carlyle ficou de pé e
disse com acuidade: "Dêem seu salário ao mercenário e deixem-no ir."
A idéia central de Jesus é que o homem que só trabalha pela recompensa
pensa mais no dinheiro que em qualquer outra coisa. O homem que trabalha por
amor pensa mais nas pessoas às quais busca servir que em qualquer outra coisa.
Jesus era o Bom Pastor que amou de tal modo a suas ovelhas que estava disposto
a arriscar, e até a entregar sua vida por elas.
Podemos assinalar dois detalhes mais antes de passar a outra passagem.
Jesus se descreve a si mesmo como o bom pastor. Agora, o grego tem duas
palavras para expressar bom. A palavra agathos que descreve a qualidade moral
de algo. A palavra kalos que assinala que a coisa ou a pessoa não só é boa mas
também na bondade há uma qualidade de atração, de beleza, que a convertem em
algo formoso. Quando se diz que Jesus é o bom pastor a palavra que se emprega é
kalos. Em Jesus há algo mais que eficiência, mais que fidelidade; há uma certa
formosura. Às vezes, nos povos, a gente fala do bom doutor. Quando o dizem, não
se referem somente à eficiência e à habilidade do médico, fazem referência à
simpatia, a bondade, a gentileza que o acompanham e que o fazem granjear a
amizade de todos. Na imagem de Jesus como o bom pastor há um elemento de beleza
além de força e poder.
O segundo detalhe é o seguinte. Na parábola, o rebanho é a Igreja de
Cristo. Este rebanho se vê ameaçado por um duplo perigo. Está constantemente
exposto ao ataque do exterior por parte dos lobos, dos salteadores e dos
saqueadores. Sempre está exposto a ter problemas em seu interior provocados
pelo falso pastor. A Igreja corre um duplo perigo. Sempre a atacam de fora.
Está acostumada a sofrer a tragédia de uma má liderança, do desastre dos
pastores que concebem seu chamado como uma carreira e não como uma forma de
serviço. O segundo perigo é o pior porque se o pastor for fiel e bom, o rebanho
é forte para resistir os ataques do exterior. Pelo contrário, se o pastor for
infiel e só está por causa do dinheiro, os inimigos exteriores podem penetrar e
destruir o rebanho. O elemento fundamental da Igreja é uma liderança baseada no
exemplo de Jesus Cristo.
A UNIDADE FINAL
Estudo sobre João 10:16
Uma das coisas das quais é mais difícil desprender-se é o sentimento de
exclusividade. Quando um povo, ou um grupo dentro de um povo, consideram que
gozam de um privilégio especial e que são diferentes do resto das pessoas,
é-lhes muito difícil dar-se conta de que os privilégios que consideravam
exclusivos estão abertos a todos os homens. Isso foi algo que os judeus nunca
aprenderam. Criam que eram o povo eleito de Deus e que Deus não queria nenhum
relacionamento com outra nação ou grupo humano. Consideravam que, no melhor dos
casos, o destino de outros povos era ser escravos dos judeus e, no pior, ser
eliminados e apagados do mundo. No entanto, aqui está Jesus afirmando que
chegará o dia quando reunirá a todos os homens e todos o reconhecerão como seu
pastor.
Nem sequer o Antigo Testamento carece de visões desse dia. Um grande
profeta a quem conhecemos com o nome do Isaías teve esse mesmo sonho. Estava
convencido de que Deus tinha posto a Israel como luz das nações (Isaías 42:6;
49:6; 56:8). Sempre houve vozes isoladas que insistiram em que Deus não era
propriedade exclusiva do povo de Israel mas sim o destino desse povo era fazer
conhecer a Deus a todos os homens.
À primeira vista, pode parecer que no Novo Testamento se expressam duas
opiniões sobre este tema. Pode ocorrer que algumas passagens nos surpreendam e
nos preocupem quando as lemos. Segundo o relato de Mateus, quando Jesus enviou
a seus discípulos a pregar, disse-lhes: “Não tomeis rumo aos gentios, nem
entreis em cidade de samaritanos; mas, de preferência, procurai as ovelhas
perdidas da casa de Israel” (Mateus 10:5-6). Quando a mulher cananéia implorou
a ajuda de Jesus, sua primeira resposta foi que não tinha sido enviado senão às
ovelhas perdidas da casa de Israel (Mateus 15:24). Mas há muitos argumentos que
indicam o contrário. O próprio Jesus permaneceu e ensinou em Samaria (João
4:40). Declarou que o fato de ser descendente de Abraão não era uma garantia
para entrar no Reino (João 8:39). Jesus falava de um centurião romano ao dizer
que jamais havia visto semelhante fé em Israel (Mateus 8:10). O único que
voltou para agradecer foi um leproso samaritano (Lucas 17:19). Foi o viajante samaritano
quem demonstrou a bondade que todos os homens devem copiar (Lucas 10:37).
Muitos viriam do Leste e do Oeste, do Norte e do Sul para sentar-se no Reino de
Deus (Mateus 8:11; Lucas 13:28). A ordem final foi que deviam sair a pregar o
evangelho a todas as nações (Marcos 16:5: Mateus 28:19).
Jesus não era a luz dos judeus e sim a luz do mundo (João 8:12). A que
se deve esta diferença? Qual é a explicação das afirmações que parecem limitar
a obra de Jesus aos judeus? Em realidade, a explicação é muito singela. O fim
último de Jesus era ganhar o mundo para Deus. Mas qualquer capitão sabe que ao
princípio deve restringir seus objetivos. Se busca atacar em uma frente ampla,
se se propõe golpear em todas partes de uma vez, a única coisa que consegue é
dispersar sua força, atomizar seu poder e não triunfa em nenhuma parte. Para
obter uma vitória final completa deve começar concentrando suas forças sobre
certos objetivos determinados e circunscritos. Isso foi o que Jesus fez. Quando
veio e quando enviou a seus discípulos, escolheu de maneira premeditada o objetivo
limitado. Se tivesse ido a todas partes e se tivesse enviado a seus discípulos
a todos os lados sem impor limitações a sua esfera de ação, não teria sucedido
nem conseguido nada. Nesse momento, concentrou-se com plena consciência e
predeterminação, no povo judeu, mas seu objetivo final era reunir o mundo
inteiro sob seu amor.
Esta passagem contém três grandes verdades.
(1) O mundo pode converter-se em um só unicamente por meio de Jesus
Cristo. Edgerton Young foi o primeiro missionário que se aproximou dos corte
vermelhas. Saiu a seu encontro no Saskatchewan e lhes falou sobre o amor de
Deus Pai. Para os indígenas foi como uma nova revelação.
Quando o missionário terminou de pronunciar sua mensagem, um velho cacique
disse: "Quando você falou há pouco do grande Espírito, eu o ouvi dizer
'Nosso Pai'?" "Sim", respondeu Edgerton Young. "Para mim isso
é muito novo e muito agradável", disse o cacique. "Nunca pensamos no
grande Espírito como um Pai. Nós o ouvimos no trovão, o vimos no raio, na
tempestade e no vento e sentimos medo. Por isso quando você nos diz que o
grande Espírito é nosso Pai, é-nos muito bonito". O ancião fez uma pausa e
logo prosseguiu enquanto um raio de glória lhe iluminou o rosto.
"Missionário, disse que o grande Espírito é seu Pai?" "Sim",
respondeu o missionário. "E você disse que é o Pai dos índios?" prosseguiu
o cacique. "Isso disse", respondeu o missionário. "Então", disse
o ancião cacique, como alguém a quem lhe revelou uma grande alegria, "Você
e eu somos irmãos!"
A única unidade possível para os homens radica em que são filhos de
Deus. No mundo, existem divisões entre uma nação e outra; dentro da nação há
divisões entre as classes sociais. Nunca pode haver uma só nação, uma só
classe. A única coisa que pode transpor as barreiras e fazer desaparecer as
diferencia é o evangelho de Jesus Cristo que fala com os homens sobre a
paternidade universal de Deus.
(2) Em algumas traduções da Bíblia se comete um engano de tradução neste
versículo. Diz-se: "Haverá um só rebanho e um só pastor." O engano se
remonta a Jerônimo e à Vulgata. E sobre essa tradução incorreta a Igreja de
Roma baseia seu ensino no sentido de que, visto que há um só rebanho só pode
haver uma Igreja, a Igreja Católica Romana, e que não existe a salvação fora
dela. Mas não há a menor dúvida de que a tradução correta é: "Haverá um
rebanho e um pastor, ou, melhor ainda, "Converter-se-ão em um rebanho e
haverá um pastor." A unidade não provém do fato de que se obriga a todas
as ovelhas a entrar num mesmo redil mas sim todas as ovelhas ouvem, respondem e
obedecem a um só pastor. Não se busca uma unidade eclesiástica mas sim a
unidade que provém da lealdade a Jesus Cristo.
Um exemplo humano ilustra isto de maneira clara. A Comunidade Britânica
de Nações não é uma unidade na qual cada nação tem o mesmo sistema de governo e
obedece à mesma administração. Os países que compõem a comunidade são
independentes; podem fazer o que querem, têm seus próprios governos, mas estão
unidos por uma lealdade comum à Rainha e à Coroa.
O fato de que há um rebanho não significa que não pode haver mais que
uma Igreja, uma forma de culto, um sistema de administração eclesiástica. O que
significa é que todas as Igrejas estão unidas por e em uma lealdade comum a
Jesus Cristo. A unidade cristã não se baseia na obediência a algum tipo de
procedimento eclesiástico, baseia-se sobre a lealdade a uma pessoa: Jesus
Cristo.
(3) Mas esta frase de Jesus se converte em algo muito pessoal: um sonho
que podemos ajudar a converter em realidade para todos. Os homens não podem
ouvir se carecerem de um pregador. As outras ovelhas não se podem unir ao
rebanho se não haver quem sai para buscálas. Aqui nos apresenta a tremenda
tarefa missionária da Igreja. E não podemos vê-la só como missões estrangeiras.
Se conhecermos alguém, aqui e agora, que está fora do amor de Cristo, Cristo o
quer para si e devemos agradá-lo. Seu sonho depende de nós. Somos nós aqueles
que podemos ajudá-lo a converter o mundo em um rebanho cujo pastor é Cristo.
A ESCOLHA DO AMOR
Estudo sobre João 10:17-18
Há poucas passagens no Novo Testamento que em tão poucas palavras nos
digam tanto sobre Jesus.
(1) Diz-nos que Jesus viu toda sua vida como um ato de obediência a
Deus. Deus lhe tinha encomendado uma tarefa e estava disposto a levá-la a cabo
até suas últimas conseqüências, inclusive se isso incluía a morte. Jesus
mantinha uma relação única com Deus. A única forma na qual podemos descrevê-la
é dizendo que era o Filho de Deus. Mas a relação não lhe dava o direito de
fazer o que quisesse; baseava-se sobre o fato de que, qualquer que fosse o
preço, sempre fazia a vontade de Deus. Para Jesus, o fato de ser o Filho de
Deus era de uma vez o maior dos privilégios e a maior responsabilidade. Para
ele, e para nós, o fato de ser filhos de Deus só pode basear-se na obediência.
(2) Diz-nos que Jesus sempre viu a cruz e a glória juntas. Nunca duvidou
de que devia morrer, tampouco duvidou de que ressuscitaria. A razão desta
certeza radicava na confiança que Jesus depositava em Deus. Jamais creu que
Deus o abandonaria. Cria que, sem dúvida alguma, a obediência a Deus lhe
reportaria sofrimento, mas também cria que essa obediência significaria a
glória. Mais ainda, cria que esse sofrimento era momentâneo e que a glória era
eterna. Toda a vida se baseia sobre o fato de que algo que vale a pena obter-se
requer sacrifícios. Deve pagar-se um preço por tudo. O conhecimento só se obtém
por meio do estudo; a habilidade em qualquer técnica ou artesanato só se obtém
com a prática; a capacidade em qualquer esporte só se obtém com o treinamento e
a disciplina. O mundo está cheio de gente que perdeu a oportunidade de cumprir
o seu destino porque não estava disposta a pagar o preço que este lhe impunha.
Ninguém pode escolher o caminho fácil e alcançar algum tipo de glória ou
grandeza. Ninguém pode optar pelo caminho difícil e não alcançar a glória e a
grandeza.
(3) Diz-nos de maneira inconfundível que a morte de Jesus foi absolutamente
voluntária. Isso é algo que Jesus repete uma e outra vez. No jardim obrigou a
seu defensor a guardar a espada. Se quisesse, poderia convocar as legiões do
céu para defendê-lo (Mateus 26:53). Quando se defrontou com Pilatos, Jesus
deixou bem claro que não era Pilatos quem o condenava mas foi Jesus quem
aceitava a morte (João 19:9-10). Jesus não foi uma vítima das circunstâncias.
Não foi como um animal a quem se arrasta ao sacrifício contra sua vontade e que
se debate nos braços do sacerdote sem saber o que acontece. Jesus entregou sua vida
voluntariamente porque escolheu fazê-lo.
Conta-se que durante a Primeira Guerra Mundial havia um soldado francês
muito ferido. Tinha o braço tão destroçado que era preciso amputar. Era um
magnífico exemplo de virilidade e o cirurgião se sentia dolorido ao pensar que
o jovem teria que ir pela vida com um só braço. Esperou junto à cama até que
recuperou a consciência para lhe dar a má notícia. Quando o moço abriu os
olhos, o cirurgião lhe disse: "Sinto lhe dizer que perdeu o braço."
"Senhor", respondeu o jovem, "não o perdi; entreguei-o pela
França."
Jesus não caiu indefeso em uma série de circunstâncias das quais não se
pôde liberar. Além de qualquer outra coisa, independentemente de qualquer poder
e ajuda divina que poderia ter solicitado, é evidente que, até o último
momento, pôde ter retrocedido salvando assim sua vida. Não perdeu sua vida;
entregou-a. Não o mataram; escolheu morrer. Não lhe foi imposto a cruz,
aceitou-a voluntariamente, por nós.
LOUCO OU FILHO DE DEUS
Estudo sobre João 10:19-21
As pessoas que ouviram a Jesus nesta oportunidade se defrontavam com o
mesmo dilema diante do qual sempre se encontram os homens. Jesus era um louco
megalomaníaco ou era o Filho de Deus. Não há forma de escapar a essa opção. Se
alguém falar a respeito de Deus e de si mesmo como o fez Jesus cabem duas
possibilidades: ou essa pessoa está completamente transtornada ou tem uma razão
profunda para fazê-lo. As afirmações de Jesus podem atribuir-se ou à loucura ou
à divindade. Como podemos estar seguros de que essas afirmações eram
justificadas e que não provinham do maior dos farsantes?
(1) As palavras de Jesus não pertencem a um louco. Poderíamos mencionar
uma testemunha atrás de outra para demonstrar que os homens sempre foram muito
conscientes de que o ensino de Jesus corresponde a maior prudência.
Em um livro chamado What I Believe, algumas pessoas escreveram aquelas
crenças que consideravam fundamentais. Lionel Curtem afirmou que cria que o
objetivo da humanidade deveria ser converter o mundo no que ele denomina a
Comunidade de Deus. Continua dizendo, "Quando me perguntam o que quero
dizer com esta comunidade, respondo: 'O Sermão da Montanha reduzido a
princípios políticos.' "
A Senhora Chiang Kai-shek disse: "Como temos que obedecer os postulados
da lei moral a fim de construir um mundo mais moral? Minha resposta, e a
resposta absoluta, em minha opinião, é o Sermão da Montanha."
A verdade é que o testemunho de pensadores e pensadoras de todas as
épocas assinalam que o ensino de Jesus é a única coisa corda que leva prudência
a um mundo enlouquecido. É a única voz que pronuncia o bom sentido de Deus em
meio do desespero humano. Não há o menor rastro de loucura nisso.
(2) Os atos de Jesus não são os de um louco. Curou os doentes, deu de
comer os famintos, consolou aos afligidos. A loucura do megalômano é egoísta.
Busca sua glorifica e prestígio. A vida de Jesus, ao contrário, estava dedicada
a servir a outros. Como diziam os próprios judeus, um homem louco não poderia
abrir os olhos dos cegos.
(3) O efeito que Jesus tem não é aquele que corresponde a um louco. A
realidade inegável é que o poder de Jesus mudou a vida de milhões e milhões de
pessoas; milhares de fracos se fortaleceram, pessoas egoístas se esqueceram de
si mesmos, gente fracassada triunfou, pessoas afligidas se acalmaram, homens
maus se tornaram bons. Não é a loucura quem produz semelhante mudança, é a
sabedoria e a prudência perfeitas.
A opção continua vigente: Jesus era louco ou divino. E não existe a pessoa
honesta que possa analisar os testemunhos e chegar a outra conclusão que não
seja a de que o que Jesus trouxe para o mundo não foi uma loucura alucinada e
sim a prudência perfeita de Deus.
A AFIRMAÇÃO E A PROMESSA
Estudo sobre João 10:22-28
João começa dando-nos o lugar e a data desta discussão A data era a
festa da dedicação. Esta era a festividade judia de mais recente instituição.
Às vezes era denominada a festa das luzes. O nome judeu era Hanukkah.
Celebrava-se no dia 25 do mês judeu chamado kislev. Este mês corresponde a
dezembro, de maneira que a festa caía muito perto de nossa celebração do Natal.
Os judeus do mundo inteiro continuam celebrando tal festa até o dia de hoje.
A origem da festa da dedicação se encontra em uma das épocas mais
sublimes de sofrimento e heroísmo da história judia. Havia um rei da Síria
chamado Antíoco Epifanes que reinou desde 175 até 164 A. C. Amava e venerava
tudo que fosse grego. Decidiu eliminar a religião judia para sempre e
introduzir os costumes, as idéias, a religião e os deuses gregos na Palestina.
A princípio, tentou levá-lo a cabo mediante uma penetração pacífica de idéias.
Alguns judeus receberam estas novidades de bom grado, mas a maioria se manteve
tenazmente fiel à sua fé ancestral.
No ano 170 A. C. se desencadeou a tormenta. Nesse ano Antíoco atacou
Jerusalém. Afirma-se que morreram 80.000 judeus e outros tantos foram vendidos
como escravos. Roubaram-se 1.800 talentos do tesouro do templo. Possuir uma
cópia da Lei ou circuncidar um menino se converteram em ofensas muito graves.
As mães que ousavam circuncidar seus filhos eram crucificadas com o menino
pendurado ao redor do pescoço. Os pátios do templo foram profanados, as
habitações do templo se converteram em bordéis. Por último, Antíoco deu um
passo terrível: converteu o grande altar das ofertas em um altar ao Zeus
Olímpico e ofereceu carne de porco aos deuses pagãos. Poluíram-se os pátios do templo
de forma tremenda e com absoluta deliberação. Foi então quando Judas Macabeu e
seus irmãos se levantaram para levar a cabo uma luta heróica pela liberdade de
seu povo. No ano 164 se obteve a vitória; esse ano se limpou e se purificou o
templo. Reconstruiu-se o altar e se substituíram as vestimentas e os utensílios
depois de quatro anos de contaminação. A festa da dedicação se instituiu para
comemorar essa purificação do templo. Judas Macabeu estabeleceu que "cada
ano, ao seu devido tempo e durante oito dias a contar do vinte e cinco do mês
de Kislev, celebrasse com alvoroço e regozijo o aniversário da dedicação do altar"
(1 Macabeus 4:59). É por isso que se havia acostumado a chamar a festividade de
festa da dedicação do altar ou da Comemoração da purificação do templo.
Entretanto, já vimos que tinha outro nome. Era costume denominá-la a
festa das luzes. Havia uma grande iluminação no templo e também em cada lar
judeu, coisa que se pode ver até na atualidade. Ficavam luzes na janela de cada
casa judia. Segundo Shamai, ficavam oito luzes na janela e cada dia se apagava
uma até que só ficava acesa a do último dia. Segundo a versão do Hillel,
acendia-se uma luz o primeiro dia e se adicionava uma cada dia até que o último
dia estavam acesas as oito luzes. Ainda podemos ver as luzes no lar de qualquer
judeu piedoso. Estas luzes tinham dois sentidos. Em primeiro lugar, afirmava-se
que com elas se recordava que a primeira vez que se celebrou a festa a luz da
liberdade tinha retornado a Israel. Em segundo lugar, remontavam a uma lenda
muito antiga. Contava-se que quando se purificou o templo e era preciso acender
o grande candelabro dos sete braços, só se encontrou um pequeno cântaro com
azeite para as lâmpadas que tinha escapado à contaminação. Estava intacto e
conservava o selo com a marca do anel do sumo sacerdote. Segundo todas as
medidas normais, o azeite que continha era suficiente apenas para acender as
lâmpadas de um só dia. Entretanto, e devido a um milagre, durou oito dias até
que se preparou o azeite novo segundo a fórmula correta e foi consagrado para seu
uso sagrado. Portanto, afirmava-se que as luzes iluminavam o templo e os lares
durante oito dias em comemoração desse cântaro que Deus tinha feito durar oito
dias em lugar de um.
Não deixa de ser significativo que deve ter sido muito perto deste período
de iluminação quando Jesus disse: "Eu sou a luz do mundo." No momento
em que se acendiam todas as luzes da cidade em comemoração da liberdade que se
obteve para adorar a Deus da única maneira correta, Jesus disse: "Eu sou a
luz do mundo, sou o único que pode iluminar os homens para que cheguem ao
conhecimento e à presença de Deus." João também nos diz qual foi o lugar
onde se desenvolveu esta discussão. Foi no pórtico de Salomão. Quando o povo
ingressava nos recintos do templo, o primeiro pátio que encontrava era o dos
gentios. Ao longo de dois de seus lados, estendiam-se duas colunatas magníficas
chamadas o pórtico real e o pórtico de Salomão. Tratava-se de fileiras de esplêndidos
pilares de quase doze metros de altura, cobertas. O povo caminhava por ali para
orar e meditar. Os rabinos passeavam pelos pórticos enquanto conversavam com
seus discípulos e expor as doutrinas da fé. Ali era onde Jesus caminhava
porque, como diz João com um toque pictórico, "era inverno". De
maneira que a discussão se desenvolveu neste momento de comemoração e ação de
graças nacional, e entre os rabinos e seus discípulos.
A AFIRMAÇÃO E A PROMESSA
Estudo sobre João 10:22-28 (continuação)
Enquanto Jesus caminhava pelo pórtico de Salomão os judeus se aproximaram.
"Durante quanto tempo", perguntaram-lhe, "manterá-nos em suspense?
nos diga abertamente é ou não é o Ungido de Deus que este nos prometeu?"
Não há a menor dúvida que havia duas posições por trás dessa pergunta. Havia
aqueles que, autenticamente, queriam saber a verdade. Estavam ansiosos pela
expectativa. Sua idéia sobre o Ungido de Deus não seria semelhante a de Jesus.
Mas estavam desejosos de saber se por fim tinha chegado o Salvador prometido e
longamente esperado. Mas também havia os outros, e eles formularam a pergunta
como uma armadilha. Queriam cercar Jesus para que pronunciasse uma afirmação que
logo pudessem tergiversar; já seja para convertê-la em uma blasfêmia da que se
podiam ocupar seus próprios tribunais ou para acusá-lo de insurreição, em cujo
caso seria o governador romano quem se ocuparia do problema.
A resposta de Jesus foi que já lhes havia dito quem era. É certo que não
o tinha feito abertamente. Segundo a versão de João, as duas grandes afirmações
de Jesus se pronunciaram em particular. Revelou-se à mulher samaritana como o
Messias (João 4:26) e ao cego de nascimento tinha dito que era o Filho de Deus
(João 9:37). Não obstante, há certas afirmações que não é necessário expressar
em palavras, em especial quando o público que as recebe está qualificado e
capacitado para recebê-las. Havia duas coisas que livravam de toda dúvida a
afirmação de Jesus mesmo se a pronunciasse ou não. Em primeiro lugar, suas ações.
O sonho do Isaías sobre a idade de ouro era o seguinte: “Então, se abrirão os
olhos dos cegos, e se desimpedirão os ouvidos dos surdos; os coxos saltarão
como cervos, e a língua dos mudos cantará" (Isaías 35:5-6). Isso era
exatamente o que estava fazendo Jesus. Cada um de seus milagres era uma
afirmação que exclamava pessoalmente que tinha chegado a idade de Deus, que
tinha vindo o Messias. Em segundo lugar, suas palavras. Moisés tinha prometido
e profetizado que Deus levantaria o profeta a quem se deveria ouvir
(Deuteronômio 18:15).
O mesmo acento de autoridade que continham as palavras de Jesus, a
maneira em que deixou de lado a Lei antiga e pôs seus próprios ensinos em seu
lugar, indicavam com toda clareza que Deus falava por meio dEle, que nEle tinha
chegado aos homens a voz encarnada de Deus. Qualquer um que ouvia Jesus falar e
via Jesus agir, não necessitava nenhuma afirmação verbal. As palavras e as
ações de Jesus eram uma afirmação contínua de que Ele era o Ungido de Deus.
Mas a grande maioria dos judeus não tinham aceito essa afirmação. Como
vimos, as ovelhas da Palestina conheciam o chamado especial de seu próprio
pastor e respondiam a ele. Pertenciam ao pastor e conheciam sua voz. Estes
judeus não pertenciam ao rebanho de Jesus. Atrás de todo o Quarto Evangelho
aparece uma doutrina da predestinação. As coisas aconteciam todo o tempo tal
como Deus as tinha previsto.
O que João diz, em realidade, é que estes judeus estavam predestinados a
não seguir e não responder a Jesus. De uma ou outra maneira todo o Novo
Testamento mantém um equilíbrio entre duas idéias opostas: o fato de que tudo
se desenvolve segundo o plano de Deus e, entretanto, tudo acontece de maneira
tal que o responsável é o livre arbítrio do homem. Estes judeus se
desenvolveram de maneira tal que estavam predestinados a não aceitar a Jesus.
Entretanto, tal como o João vê, isso não significa que serão condenados.
Não obstante, embora eles não aceitavam a Jesus havia aqueles que estava
dispostos a aceitá-lo. E a eles, Jesus ofereceu e prometeu três coisas.
(1) Prometeu-lhes a vida eterna. Prometeu-lhes a possibilidade de perceber
uma amostra dessa vida que é própria de Deus. Prometeu-lhes que se o aceitavam
como Mestre e Senhor, se eles se uniam a seu rebanho, toda a pequenez da vida
terrestre desapareceria e conheceriam o esplendor e a magnificência da vida de
Deus.
(2) Prometeu-lhes uma vida que não teria fim. Jamais pereceriam. Para
eles, a morte não significaria nada; não seria o fim e sim o começo. Jamais
desapareceriam ou penetrariam nas trevas. Conheceriam a glória da vida
indestrutível.
(3) Prometeu-lhes uma vida segura. Nada os poderia arrancar de sua mão.
Isto não significava que seriam livres da dor, o sofrimento ou a morte.
Significava que no momento mais amargo e na hora mais escura continuariam sendo
conscientes dos braços eternos que os rodeavam e os sustentavam. Conheceriam
uma segurança que todos os perigos e os alarmes do mundo não poderiam fazer
naufragar. Até em um mundo que se desmoronada rumo ao desastre, eles
conheceriam a serenidade de Deus.
A GRANDE CONFIANÇA E A TREMENDA AFIRMAÇÃO
Estudo sobre João 10:29-30
Esta passagem nos mostra tanto a grande confiança de Jesus como sua
tremenda afirmação a respeito de si mesmo. A confiança de Jesus buscava a
origem de todas as coisas em Deus. Logo tinha falado sobre suas ovelhas e seu
rebanho. Acabava de dizer que nunca ninguém arrebatará a suas ovelhas de sua
mão, que Ele é o pastor que sempre manterá a salvo as ovelhas. À primeira vista
e se ficasse ali, teria parecido que Jesus cifrava toda sua confiança em sua própria
atração e em seu poder de liderança. Mas agora vemos o outro lado. Foi seu Pai
quem lhe deu as ovelhas; tanto Ele como suas ovelhas estão a salvo na mão de
seu Pai. Jesus estava tão seguro de si mesmo porque estava muito seguro de
Deus. A atitude de Jesus rumo à vida não era de confiança em si mesmo mas sim
de confiança em Deus. Jesus estava seguro não por seu próprio poder mas sim
pelo poder de Deus. Jesus não duvidava da segurança e da vitória finais não
porque se atribuía todo o poder mas sim porque atribuía todo o poder a Deus.
E agora chegamos à suprema afirmação. "Eu e o Pai somos um", disse
Jesus. O que quis dizer com isso? Tratava-se de um mistério absoluto ou podemos
entender pelo menos uma parte? Vemo-nos impelidos a interpretá-lo em termos de
essência e hipóstase e todas as demais noções metafísicas e filosóficas sobre
as quais lutaram, discutiram e brigaram aqueles que elaboraram os credos? Acaso
é necessário ser um teólogo profundo e um filósofo para compreender sequer um
fragmento do significado desta tremenda afirmação? Se nos remetermos à própria
Bíblia para interpretar esta passagem descobriremos que é tão simples que até a
mente mais simples o pode compreender. O que Jesus quis dizer ao afirmar que
ele e o Pai são um? Nos adiantemos um pouco e leiamos João capítulo 17. Aí João
nos fala sobre a oração que Jesus ensinou aos seus antes de ir rumo à morte.
Orou assim: “Pai santo, guarda-os em teu nome, que me deste, para que eles sejam
um, assim como nós” (João 17:11). Aí fica claro que Jesus concebia a unidade
entre os cristãos como algo idêntico à unidade entre Ele e seu Pai. Ele o
expressa com a maior clareza. Na mesma passagem continua: “Não rogo somente por
estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua
palavra; a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti,
também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes
tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o somos”
(João 17:20-22).
Aí Jesus diz com simplicidade e clareza que ninguém pode duvidar que a
meta final da vida cristã é que os cristãos devem ser um como o são Ele e seu
Pai.
Agora, qual é essa unidade que deve existir entre os cristãos? O que é o
que faz que um cristão seja um com seu próximo? O segredo dessa unidade é o
amor. “Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; assim como eu vos
amei, que também vos ameis uns aos outros” (João 13:34). Os cristãos são um
porque se amam uns aos outros. Do mesmo modo, Jesus é um com Deus por seu amor
para com Deus. Mas podemos ir mais longe. Qual é a única prova e garantia do amor?
Voltemos às palavras de Jesus. “Se guardardes os meus mandamentos,
permanecereis no meu amor; assim como também eu tenho guardado os mandamentos
de meu Pai e no seu amor permaneço” (João 15:10). “Se alguém me ama, guardará a
minha palavra” (João 14:23-24). “Se me amais, guardareis os meus mandamentos”
(João 14:15). “Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me
ama” (João 14:21).
Este é o nó da questão. O laço de união é o amor; a prova do amor é a
obediência. Os cristãos são um quando estão unidos pelo laço da unidade e
quando obedecem as palavras de Cristo. Jesus é um com Deus porque obedeceu e
amou a Deus como ninguém o fez antes. Sua unidade com Deus é uma união de amor
perfeito que se manifesta em uma obediência perfeita.
Quando Jesus disse: "Eu e o Pai somos um", não se estava
movendo no mundo da filosofia, da metafísica e das abstrações; movia-se no âmbito
das relações pessoais. Ninguém pode entender com clareza o que significa a
frase "unidade de essência", mas qualquer um compreende o que significa
a unidade de corações. A unidade de Jesus com Deus surgia de duas coisas: o
amor perfeito e a obediência perfeita. Era um com Deus porque o amava e o
obedecia à perfeição. E veio a este mundo para nos fazer igual a Ele.
UM CONVITE À PROVA AMARGA
Estudo sobre João 10:31-39
Para os judeus, a afirmação de Jesus de que ele e o Pai eram um constituía
uma blasfêmia, um insulto contra Deus. Era a invasão da parte de um homem do
lugar que pertencia exclusivamente a Deus. Tratava-se de um ser humano que
afirmava ser igual a Deus. A Lei judia estabelecia que a blasfêmia se devia
castigar com o apedrejamento. “Aquele que blasfemar o nome do SENHOR será
morto; toda a congregação o apedrejará” (Levítico 24:16). De maneira que os
judeus se prepararam para apedrejar a Jesus. A frase grega significa, em
realidade, que foram buscar pedras para lançar-lhe. Jesus saiu ao encontro de
sua hostilidade com três argumentos.
(1) Disse-lhes que tinha passado todos os dias de sua vida fazendo coisas
bonitas: curando os doentes, alimentando os famintos e consolando aqueles que
sofriam. Estas ações estavam tão cheios de poder, beleza e ajuda que era
evidente que provinham de Deus. Por qual dessas boas obras queriam apedrejá-lo?
A resposta dos judeus foi que não era por nenhuma de suas obras que queriam
apedrejá-lo mas sim pelas afirmações que fazia.
(2) Qual era essa afirmação? Afirmava ser o Filho de Deus. Jesus empregou
dois argumentos para sustentar essa afirmação. O primeiro é estritamente judeu
e nos é difícil entendê-lo. Citou o Salmo 82:6. Esse salmo é uma advertência
contra os juízes injustos. É uma advertência àquelas pessoas a quem foi
confiado a função de juízes para que cessem em suas práticas injustas e
defendam os pobres e os inocentes. O chamado termina assim: "Eu disse: Vós
sois deuses, e todos vós filhos do Altíssimo". Deus encarrega o juiz de
levar seu ajuda e sua justiça aos homens. O juiz é Deus para os homens. Esta
idéia aparece com toda clareza em algumas dos regulamentos de Êxodo. Êxodo
21:1-6 diz de que maneira o servo hebreu pode ficar livre ao sétimo ano. O versículo
6 diz: "Então seu amo o levará perante os juízes". Mas na versão
hebraica, a palavra que se traduz por juízes é elohim, que significa deuses. Em
Êxodo 22:9,28 se usa a mesma expressão. Até as Escrituras, ao falar dos homens
aos quais Deus encarregou uma tarefa, referiam-se a eles como deuses. Portanto,
Jesus disse: "Se as Escrituras podem falar assim sobre os homens, por que
não posso usar os mesmos termos para falar de mim mesmo?
Jesus afirmou duas coisas a respeito de si mesmo.
(a) Deus o santificou para cumprir uma tarefa especial. A palavra que
designa santificar é hagiazein. Deste verbo procede o adjetivo hagios, que
significa santo. Agora, esta palavra sempre indica a idéia de converter uma
pessoa, um lugar ou uma coisa em algo diferente de outros porque é separada
para um fim especial ou para cumprir uma tarefa determinada. Uma coisa ou uma
pessoa é santa porque foi separada para cumprir uma tarefa que é diferente das
tarefas comuns de todos os dias. É assim como o sábado, por exemplo, é santo
(Êxodo 20:11). É distinto dos outros dias porque era separado para algo
especial. O altar é santo (Levítico 16:19). Não é igual a qualquer outra parte
de pedra ou a qualquer outra estrutura porque foi construído e separado para um
fim determinado. Os sacerdotes são santos (2 Crônicas 26:18). São diferentes
dos outros homens porque foram separados para cumprir um trabalho e uma tarefa
especiais. O profeta é santo (Jeremias 1:5). É distinto dos outros homens porque
lhe foi encomendada uma tarefa especial e diferente.
Quando Jesus disse que Deus o tinha santificado, consagrado, quis dizer
que Deus o tinha separado dos outros homens porque lhe tinha encomendado uma
tarefa especial. O fato mesmo de que Jesus usasse esta palavra demonstra quão
consciente era de que Deus lhe tinha encarregado um trabalho especial.
(b) Jesus disse que Deus o enviou ao mundo. A palavra que se emprega é a
que se aplicaria quando se fala de despachar um mensageiro, um embaixador, um
exército ou uma brigada de trabalho. Quando Jesus empregou essa palavra
demonstrou que não se via si mesmo tanto como alguém que tinha vindo ao mundo,
mas sim como alguém que tinha sido enviado. Sua vinda foi um ato de Deus, veio
para representar a Deus, veio para cumprir com a tarefa que Deus lhe encomendou.
De maneira que Jesus disse: "Nos tempos da antiguidade a Escritura podia
referir-se aos juízes como a deuses porque Deus lhes tinha encarregado que
levassem sua verdade e sua justiça ao mundo. Agora, me separado de outros para
cumprir uma tarefa especial. Deus me enviou ao mundo como podem objetar se digo
ser o Filho de Deus? Só faço o mesmo que fazem as Escrituras." Busca-se um
argumento bíblico cujo poder nos é difícil perceber. Entretanto, seria
absolutamente convincente para qualquer rabino judeu. Tratava-se do tipo de
argumentação, baseado sobre as palavras das Escrituras, que os rabinos usavam
com maior prazer e que era quase impossível contradizer.
(3) Logo Jesus os convidou a passar por uma prova amarga. "Não lhes
peço", disse, "que aceitem minhas palavras. O que sim lhes peço é que
aceitem minhas obras". Qualquer um pode discutir a respeito das palavras;
mas não há nenhuma discussão a respeito das obras. Qualquer um pode duvidar e
discutir com todo direito sobre as afirmações que alguém faz a respeito de si
mesmo; mas não pode discutir quando se enfrenta com as obras dessa mesma
pessoa. Jesus é o mestre perfeito porque não baseia suas afirmações sobre o que
disse e sim sobre o que é e o que faz. Convoca à prova amarga, a prova das
obras. O convite que fez aos judeus foi que fundassem seu veredicto a respeito
dele, não baseando-se em suas palavras e sim em suas obras. E todos os seus discípulos
deveriam ser capazes de passar por essa prova. A tragédia da Igreja é que são
muito poucos aqueles que podem fazê-lo, e menos ainda aqueles que podem
convidar a outros a passar por ela.
A PAZ QUE PRECEDE A TORMENTA
Estudo sobre João 10:40-42
O tempo de Jesus chegava a seu fim, mas Jesus sabia qual era seu tempo.
Não estava disposto a brincar com o perigo de maneira irresponsável e
desperdiçar sua vida. Tampouco evitaria o perigo com covardia para conservar a
vida. Mas desejava afastar-se para um lugar tranqüilo antes de enfrentar a luta
final. Jesus sempre saía da presença de Deus para chegar à presença dos homens.
Sempre se fortalecia e se preparava para encontrar-se com os homens mediante um
encontro com Deus. Essa é a razão pela qual se retirou ao outro lado do Jordão
Não estava escapando; preparava-se para o último combate.
Entretanto, o lugar aonde foi é muito significativo. Foi ao lugar onde
João estava acostumado a batizar; onde ele mesmo tinha sido batizado. Ali foi
onde ouviu a voz de Deus que lhe assegurou que tomou o caminho reto e a decisão
adequada. É muito o que se pode dizer sobre o homem que retorna de vez em
quando ao lugar onde teve a maior experiência de sua vida.
Quando Jacó estava na parte mais bravia de sua luta, quando todas as
coisas andavam muito mal, voltou para Betel (Gênesis 35:1-5). Quando necessitava
a Deus, retornou ao lugar onde encontrou a Deus. Antes do fim, Jesus retornou
ao lugar onde se produziu o princípio. Em mais de uma ocasião, significaria um
imenso bem para nossas almas se retornássemos ao lugar onde Deus nos encontrou
e onde nós o encontramos.
Apesar de que estava em um ponto afastado do Jordão, os judeus se aproximaram
de Jesus e eles também pensaram em João. Recordaram que tinha falado com as
palavras de um profeta mas não tinha feito obras maravilhosas. Viam que havia
uma diferença entre Jesus e João. À proclamação de João, Jesus adicionava o
poder de Deus. João tinha podido diagnosticar a situação; Jesus havia trazido o
poder necessário para enfrentá-la. Estes judeus tinham considerado que João era
um profeta. Agora viam que tudo o que João tinha profetizado sobre Jesus era
certo. E muitos deles creram.
Acontece com muita freqüência que o homem a quem se augurou um grande
futuro e em quem muitos cifraram suas esperanças, defrauda esse futuro e
frustra as esperanças. A grandeza de Jesus, ao contrário, radica em que
inclusive superou o que João tinha anunciado. Jesus é a única pessoa que jamais
defrauda àqueles que cifram suas esperanças nEle. É a única pessoa que faz com
que os sonhos sempre se convertam em realidade.