Comentário sobre João 17:5

          Com base nisso, ele também pode pedir ao Pai com plena confiança: “E, agora, glorifica-me, ó Pai, junto de ti, com a glória que eu tive, antes que houvesse mundo, junto de ti.” Nesse momento seu olhar e seu anseio ultrapassam a “exaltação” na cruz, chegando à glória perfeita, que corresponde ao que ele já possuía originalmente. Também agora, em sua trajetória em direção à desonra da cruz, Jesus sustenta com tranqüila convicção que ele “vem do alto” e “do céu” (Jo 3.31; 8.23), da “glória” que ele tinha junto do Pai antes da criação do mundo.693 Foi dessa glória que ele se esvaziou (Fp 2.5ss) ao se tornar “carne”. Ainda assim, podia ser “vista” por olhos iluminados (Jo 1.14). Contudo, ao sair agora do mundo para o Pai, sua glória lhe é devolvida integralmente. É divinamente “justo” que aconteça assim, e o Espírito Santo convence o mundo dessa “’justiça” (Jo 16.10). No entanto, a nova glorificação, que Jesus espera e pede, não é simplesmente o restabelecimento de uma situação anterior, pois agora é glorificado aquele que aceitou a condição humana de modo imperdível. Nessa humanidade ele experimentou o que o Filho eterno de Deus, por sua essência, jamais poderia experimentar e alcançar: tortura, desonra, maldição e morte. Também como novamente exaltado ele continua sendo aquele que traz as chagas, sendo realmente reconhecível através delas (Jo 20.24-28). Por essa razão a “glória de Filho” que ele recebe agora é completamente outra, repleta de toda a imensa obra da redenção. Agora vale o júbilo de adoração de Ap 5.12: “Digno é o Cordeiro que foi morto de receber o poder, e riqueza, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e louvor.”694 Assim o Filho ainda não podia ser enaltecido em sua glória original. Essa prece de Jesus enfatiza duas vezes que a glória original, assim como a que agora é esperada, não é nada que o Filho possa ter em e para si mesmo. Unicamente o Pai pode glorificar o Filho, e o Filho somente pode pedir por essa glória e recebê-la do Pai. Uma construção complicada da frase, que mantivemos também na tradução, ressalta especialmente o duplo “junto de ti”: somente estando junto do Pai o Filho possui glória. Na vida do discípulo, isso corresponde à circunstância de que também ele jamais poderá encontrar vida eterna e glória em sua própria existência, nem mesmo na consumação, mas unicamente em “estar junto de Cristo” (v. 22-24).695
[1]





693 Quem define a preexistência de Jesus como “mitologia” e nega sua realidade factual, destrói o fundamento da obra de Jesus e esvazia o evangelho.
694 Cf. também Ap 7.9-17; 21.23.
695 A esse respeito, cf. também Rm 8.17,29; Fp 1.23; 1Jo 3.2.
[1]Boor, W. d. (2002; 2008). Comentário Esperança, Evangelho de João; Comentário Esperança, João (380). Editora Evangélica Esperança; Curitiba.