Comentário de João 17:11

            Por que Jesus precisa interceder por eles? “Já não estou no mundo, mas eles continuam no mundo, ao passo que eu vou para junto de ti.” Jesus agora pode sair de todas as aflições, lutas e tribulações do mundo e ir para a glória junto do Pai. Os discípulos, porém, ainda não podem acompanhá-lo. Eles “estão no mundo”. Jesus sabe o que isso significa. O mundo é como um largo e forte rio cuja correnteza arrasta tudo incessantemente, cada vez mais para longe de Deus. Procedem também do mundo os intensos golpes com que o senhor do mundo tenta arrancar os fiéis de Deus. “Estar no mundo” significa ter de viver constantemente no seu ódio . Será que os discípulos não sucumbirão? Não fraquejarão (1Ts 3.3), deixando-se arrastar imperceptivelmente para longe de Deus? Nessa situação irrompe a prece de Jesus: “Pai santo, guarda-o [ou: os] em teu nome, que me deste.” Em vista de todo o poder do mundo e de seu príncipe, Jesus se conscientiza da santa magnitude e do poder de Deus. O Pai é o “Santo” que certamente é capaz de proteger os discípulos por meio de seu poder e sua glória divinos e superiores ao mundo. Como “Pai santo”, Ele também o fará por sua fidelidade, uma vez que deu essas pessoas ao Filho. Jesus roga que o Pai as “guarde em seu nome”.705 Não se trata de proteger contra aflição e sofrimentos. Tampouco de preservar seu bem-estar terreno ou sua vida passageira. Contudo, em todas as situações devem permanecer naquilo que o “nome de Deus” lhes revelou a respeito da essência, da verdade, do poder e da graça de Deus. Jesus suplica que seus discípulos preservem o “nome de Deus” também no fracasso, em derrotas, medo e tribulação, dessa maneira permanecendo apegados a Deus, porque Deus os segura.
Se a forma, inicialmente estranha para nós, estiver correta, então Jesus acrescentou “que me deste” a “nome de Deus” (no qual os discípulos devem ser guardados). Nesse caso, o presente texto também enfatiza que esse “nome de Deus” existe para nós unicamente porque Jesus no-lo manifestou. Ao fazê-lo, Jesus apenas passou adiante o que o Pai lhe dera. O Filho é o primeiro a quem Deus revelou sua natureza mais íntima e seu nome de Pai. Não se trata da expressão “Pai” como tal. Ela já fora usada no AT.706 Contudo, é significativo que ele use essa expressão apenas esparsa e predominantemente em palavras que apontam para o futuro. Aquilo que a verdadeira “natureza de Deus como Pai” encerra ficou manifesto no “Filho”.707 Por isso, tampouco podemos aprender o nome de Deus como Pai a partir das palavras de Jesus de forma apenas teórica, mas Jesus tem de no-lo “revelar” com todo o seu ser (v. 6), e o próprio Pai precisa nos “guardar” nesse seu nome.708
Jesus acrescenta mais um aspecto à prece: “Para que sejam um, assim como nós.” Ao orar, Jesus contempla vivamente o que nós esquecemos em grande medida. Não se trata de discípulos isolados, solitários, que precisam ser guardados individualmente. Trata-se da irmandade dos seus, que se encontra sob o seu mandamento do amor (Jo 13.34; 15.12,17). No nome do Pai eles somente serão preservados se a sua unidade for mantida. “Ser um, como nós” vê essa unidade de forma bem íntima e livre, e justamente por isso firme e plena. Os v. 22s apresentarão esse fato mais uma vez.[1]




705 Novamente se cumpre a Escritura do AT: “O nome do Senhor é um castelo firme. O justo entra nele e é protegido” (Pv 18.19 ).
706 2Sm 7.14; Sl 68.5; Is 9.6; 63.16; Jr 3.19; 31.9; Ml 1.6; 2.10.
707 Portanto, não devemos pensar que já sabemos o que de fato é a paternidade de Deus, explicando daí a essência de Deus. A perspectiva é oposta. Tudo o que em geral chamamos de “pai” encontra-se sob a luz da paternidade de Deus e apenas pode ser compreendido corretamente nessa luz (Ef 3.15, literalmente: “de quem toma o nome toda paternidade, tanto no céu como sobre a terra”).
708 Somente então também será possível orar realmente o Pai Nosso. Se não recebemos a revelação de Deus por intermédio de Jesus, então não sabemos do que estamos falando quando proferimos o Pai Nosso como oração aprendida. De acordo com a palavra de Jesus em Jo 14.6 pode-se afirmar com razão: “Ninguém vem ao Pai senão por mim.”
[1]Boor, W. d. (2002; 2008). Comentário Esperança, Evangelho de João; Comentário Esperança, João (384). Editora Evangélica Esperança; Curitiba.