Parábola do Grão de Trigo

Parábola do Grão de Trigo
(Jo 12:20-26)

Quando eu era um jovem cristão, há cerca de meio século, ouvi a última pregação do dr. F. B. Meyer na festa de uma colheita. Sua mensagem baseava-se nesse tema: Como Tratar da Fertilidade da Vida Sacrificial, e causou uma impressão indelével em minha mente. Aquele renomado, eloquente e piedoso pregador deixou claro que:

A vida do eu é morte,
A morte do eu é vida.

O capítulo 12 de João marca o fim do ministério público de Cristo. Dos capítulos 13 ao 17, Jesus está sozinho com os seus discípulos, e o mundo o exclui. Sua parábola sobre o grão de trigo surgiu do pedido dos gregos, ou gentios, que desejavam "ver a Jesus". Eles vieram, naturalmente, a Filipe e André, que eram os únicos apóstolos com nomes gentios. Jesus, ao perceber a aproximação daqueles homens, os quais não pertenciam ao Judaísmo, anunciou que "A hora marcada no conselho de Deus, e sempre presente no seu pensamento, havia chegado". Ele não falara que daria sua vida por aquelas ovelhas (os judeus), e pelas outras (os gentios), ou seja, morreria tanto pelos judeus como pelos gentios? (Jo 10:16-19). Esses gregos seriam "os primeiros frutos do grande rebanho da humanidade, e sua presença é a primeira badalada do sino que soa a hora fatal, mas gloriosa".

Mas, para o simples grão de trigo produzir generosa colheita, precisa cair na terra e morrer. Assim Jesus passa para a sua mística palavra com um solene e usual "em verdade, em verdade". Por si mesmo, o grão de trigo permanece um simples grão; mas, se cair na terra, a natureza o multiplica. Da morte surge a vida. Uma colheita vem de um grão. Jesus usou essa analogia de uma lei natural, para ilustrar o que acontece semelhantemente no mundo moral e espiritual. Somente se o grão for enterrado na terra, o gérmen pode brotar e produzir folha, talo e espiga. A morte resulta em verdadeira vida, pois "libera o poder vital interior que a casca, antes, escondera prisioneiro; e esse poder vital multiplica-se em sucessivos grãos e vestirá todo o campo com a colheita de frutos".

Jesus, antes de tudo, aplicou essa lei da vida que surge da morte ao mundo moral. Se a vida é amada simplesmente por si mesma, está perdida. Mas se está perdida no bem-estar de outros, então essa vida perdida é salva e mantida. A própria vida morre drasticamente; e o martírio é algo difícil para a carne encarar. Egoísmo e amor próprio nunca resultam em abençoada colheita divina. Toda auto-abnegação, contudo, quer no andar diário de serviço a outros, quer na devoção de tudo o que somos e temos a Deus, obtém uma abundante colheita como galardão.

As frases: "É chegada a hora"; "Agora meu coração está angustiado, e que direi? Pai, salva-me desta hora?"; "Mas eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim", apontam para o Calvário, quando Jesus, como divino grão de trigo, foi semeado e morreu tanto pelos judeus como pelos gentios, que estavam sujeitos ao príncipe deste mundo (Jo 8:44; Rm 2). Jesus sabia que, através daquela morte pavorosa (Mt 26:39), seria capaz de atrair a si todos os homens. Ele considerava sua própria morte um caminho escuro que deveria ser trilhado, a fim de que as multidões, que ninguém pode contar, pudessem caminhar para a glória. Enquanto Jesus estivesse na terra, seria como um grão de trigo e teria em seu gérmen a vida para todos. Mas, através de sua morte e ressurreição, brotou e houve imediata colheita, como provam as quase 3 mil pessoas que o aceitaram como Salvador no dia de Pentecostes. Desde então a colheita se multiplicou, como claramente revelam Atos dos Apóstolos, e a sua alma ficou satisfeita.

Estamos preparados para seguir o Mestre em auto-abnegação? Porque se nós:

Vivermos para nós mesmos, viveremos em vão;
Mas se vivermos para Cristo, viveremos outra vez."

Anos atrás vi essa frase em uma Lavanderia e Tinturaria, a qual muito me intrigou:

Vivemos para tingir,
Tingimos para viver.

Se trocarmos "tingir" por "morrer", teremos diante de nós uma pro-funda verdade espiritual. Ávida egoísta, cuja circunferência e centro é o próprio eu, é uma vida inútil e isolada; mas a vida sacrificial, com Deus e os outros como o centro e circunferência de vida e trabalho, tem em vista a multiplicação da nossa influência e a colheita de almas a nos saudar diante do Tribunal de Cristo (lTs 2:19,20).


Fonte: Todas as Parábolas da Bíblia de Herbert Lockyer, São Paulo, Editora Vida, 2006.